Deputada do Texas propõe lei para multar masturbação masculina em protesto contra restrições ao aborto
14 mar 2017
06h38
atualizado às 11h37
A deputada democrata Jessica Farrar, do Texas, no sul dos Estados
Unidos, encontrou uma forma pouco usual de dar uma resposta ao que ela
vê como leis restrivas de aborto no Estado: propôs uma lei que proíbe a
masturbação masculina.
Ela argumenta que o objetivo da lei é proteger crianças que ainda estão
por ser geradas. A lei quer proibir "todas as ejaculações fora da
vagina de uma mulher ou criadas fora de uma instalação médica ou de
saúde". Quem for pego burlando a regra teria de pagar uma multa de US$
100.
Se um homem ejacula sozinho, por exemplo, pela masturbação, isso seria
considerado um "ato contra uma criança que ainda não nasceu".
Pode até soar absurdo - mas a intenção da deputada é esquentar o debate sobre o aborto.
Proposta
Jessica Farrar apresentou o projeto de lei número 4260 na semana
passada. Ela sabe que ele nunca sairá do papel. E é pouco provável que
vá muito longe antes de ser derrubado. Mas ela argumenta que sua
proposta não é mais extrema do que as leis que restringem os direitos de
mulheres que eventualmente optariam pela interrupção de uma gravidez no
Estado do Texas.
"Se estamos adotando essas medidas por causa da 'santidade da vida', então nós não podemos desperdiçar nenhuma semente."
Legisladores do Estado recentemente propuseram uma lei que obriga
mulheres que optaram por um aborto a escolher se queriam enterrar ou
cremar os restos do embrião.
Durante uma sessão em que se discutiu a proposta, o senador Don
Huffines disse: "Por muito tempo, Texas permitiu que os mais inocente
entre nós fossem jogados fora como lixo".
Mas Farrar decidiu dar um novo significado a essa tese. "Isso me fez
pensar…talvez o que é bom para a mulher, também seja bom para o homem",
afirmou à BBC.
"Se estamos adotando essas medidas por causa da 'santidade da vida', então nós não podemos desperdiçar nenhuma semente."
Mas sua ideia não passou em brancas nuvens - e houve muitos que a
criticaram por isso. "Um plano estúpido", afirmou um crítico no Twitter,
dizendo que apenas o embrião fertilizado precisa de proteção e
perguntando se ela usaria a lei também para a menstruação de mulheres.
"A vida começa na concepção", disse ele.
Restrições
O Texas tem uma das legislações mais restritas sobre aborto nos Estados
Unidos - ainda que a Suprema Corte tenha derrubado, no Estado, a
probição de abortos induzidos por drogas após sete semanas de gestação.
Mas as restrições ainda fazem as clínicas de aborto serem extremamente escassas no Estado. De acordo com o jornal
Texas Tribune,
havia apenas 19 clínicas disponíveis na região em junho de 2016, a maioria delas concentrada nas áreas urbanas.
Isso faz com que 95% dos municípios dentro das amplas fronteiras do
Texas não tenham uma clínica. Nos 885 quilômetros entre San Antonio e El
Paso (distância aproximada entre São Paulo e Vitória-ES) não há nenhuma
clínica de aborto.
Farrar também cita sua revolta com o processo desgastante e invasivo a
que mulheres que optam pelo aborto são submetidas no Estado. Elas têm
de, por exemplo, ouvir palestras sobre as implicações morais do aborto,
ver imagens de fetos, fazer um ultrassom para ouvir a batida do coração
do bebê e receber avisos sobre como aborto pode estar relacionado a
câncer de mama - ainda que essa possibilidade já tenha sido descartada.
"Está claro que isso é uma tentativa de manipulação", disse Farrar, que
até sugere na sua proposta algo "equivalente" para os homens, como um
"exame retal digital".
"É como se as mulheres nunca tivessem pensado sobre isso (aborto). O
fato é: apenas ela sabe o que aconteceu em sua vida", disse.
Entre as mulheres do Estado, muitas têm outra visão. O grupo New Wave
Feminists (Feministas na Nova Onda, na tradução livre) do Texas, por
exemplo, diz que quer apoiar a mulher, mas acredita que um feto tem
direitos também.
"Muitos diriam que o feto é o membro mais vulnerável da família humana
e, apesar disso, porque ele é pequeno, mais fraco e não pode nos pedir
para parar, nós decidimos que está tudo bem descartá-lo da maneira como
acharmos melhor", afirma a organização.
As mulheres do Texas, porém, não são as únicas a enfrentar legislações mais conservadoras sobre aborto nos Estados Unidos.
Ativistas antiaborto e seus simpatizantes ganharam força no governo de
Donald Trump, que tem se distanciado da postura "pró-escolha" do governo
de Barack Obama.
Várias novas restrições têm sido propostas por deputados em vários
cantos do país. Entre elas, está a de obrigar mulheres em Oklahoma a
pedir permissão aos seus parceiros para aprovar seu aborto.
No Brasil, a interrupção da gravidez só é permitida em três casos: se a
mulher corre risco de morrer por causa da gestação; se a fecundação
ocorreu por estupro; se o feto é anencéfalo (sem cérebro) e, portanto,
não conseguirá sobreviver após o parto.
Nas demais situações, a gestante que fizer aborto pode ser presa por
até três anos, enquanto médicos que realizarem o procedimento podem ser
condenados a até quatro.
'Incubadoras' humanas
O homem que propôs a lei em Oklahoma defende que uma mulheres grávida seria uma "hospedeira" de uma criança ainda não nascida.
Ideias como esta preocupam Farrar. "Nós estamos lidando com mais
propostas de medidas que tratam a mulher como uma 'incubadora'", disse
ela, que foi eleita deputada no Texas pela primeira vez em 1994.
No Texas, o direito à vida de uma criança que ainda não nasceu se
sobrepõe à ordem de "não-ressuscitação" nos casos dos fetos de mulheres
grávidas.
Um ordem judicial dessas determina que médicos não tentem trazer um
paciente de volta à vida se ele parar de respirar ou se seu coração não
estiver mais batendo - por causa do dano que isso já causou ao paciente.
Agora, uma legislação proposta forçaria as mulheres a carregarem um
feto "inviável" - como um feto anencéfalo, por exemplo - até o
nascimento, se a condição só for descoberta depois de 20 semanas de
gestação.
Outra lei prevê até mesmo que o médico não revele a condição do feto -
se for "inviável" - à família se ele sentir que a mulhere pode optar
pelo aborto.
Elizabeth Graham, diretora da organização antiaborto Texas Right to
Life (Texas Direito à Vida, na tradução livre), defende a preservação da
vida do feto.
"Os critérios atuais que permitem que crianças não nascidas com
deficiências sejam selecionadas para morrer não são apenas vergonhosos
para o Estado, como também moralmente inconcebíveis", disse.
Já Farrar alega que é importante resolver questões mais urgentes, como o
fato de o Texas ter a maior taxa de morte materna do mundo
desenvolvido.
"Acho que o motivo pelo qual estamos onde estamos é porque as pessoas
toleraram essas coisas até agora. Eu espero que minha proposta possa
acordar as pessoas", finalizou.
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